Fiquei
surpreso e entristecido com o texto de Jânio de Freitas que li em 17 de abril
próximo passado na Folha de São Paulo. Não porque constate que chegamos a uma encruzilhada, mas pelo
fato de que irrefletidamente repete uma avaliação pejorativa do povo e da
sociedade brasileira como inapta para a vivência da democracia.
Não
acredito que continuamos a repetir arengas da década de 70 e 80 de que somos
historicamente inaptos para o regime democrático, quando os fatos de 1992 e
2016 o provam de forma peremptória o contrário.
Estou
de acordo que a democracia exige refinamento, que sua construção é difícil, mas
quando vejo as instituições da república funcionando, acredito que estamos
muito próximos da maturidade política e democrática. O que nos falta é uma
reforma política para retirar a blindagem do sistema político e permitir maior
transparência e maior engajamento das forças vivas da sociedade.
A
forma preconceituosa de se referir ao desenvolvimento mental da minoritária
camada da sociedade que detém os instrumentos de direção política é muito
dolorosa e desrespeitosa com nossa sociedade. Falta de conhecimento do que nos
esperava, e que já estava delineado por cientistas políticos sérios desde
meados de final da primeira década deste século, como a constatação de que o
que vivemos é fruto da liderança carismática, exercida nos moldes weberianos
por Lula, e que José de Souza Martins (A Política no Brasil: lúmpen e místico)
já denunciava como aquele que se utilizou de instrumentos de clientelismo
eleitoral, institucionalizando o conformismo político, incorporando ao mesmo
tempo massas desvalidas e tuteladas pelo Estado megalômano ao plano clientelista
neopopulista de esquerda.
Se
podemos reprovar alguma falta de qualidade moral, só podemos reputá-la neste
momento ao mal que Luiz Inácio Lula da Silva fez para o desenvolvimento de uma
sadia sociedade política plural e mais democrática. O preço do aparelhamento do
Estado e do plano de neopopulismo de esquerda clientelista, tornou-se alto
demais, falindo o próprio Estado e chegando ao impasse político que vivemos.
O
discurso de ver o Brasil como um país atrasado de industrialização tardia denota
um conhecimento raso de história geopolítica, na medida em que o nosso país foi
concebido e construído por uma nação de heróis, onde viviam pouco mais de 1
milhão de almas no século XVI. Mesmo assim, somos uma das maiores nações do
planeta. Mesmo estando à margem dos fluxos de comércio e dos capitais desde a
origem do mercantilismo.
Lamentável
os estereótipos lançados sem pejo pelo colunista. Se a classe dominante, “as
elite (sic)”, preferem amontoar patrimônio com pouca avidez pelo investimento
em produção e crescimento, isto se dá porque o golpe republicano trouxe para o
Estado o domínio de oligarquias regionais que se encastelaram no poder e se
repetem em desfavor da sociedade, mas, e é importante salientar, não são
alteradas, mesmo pelo líder popular, que se alia a elas, já que Lula é um
político sem ideologia que precisa para se eleger de um partido sem votos. O
problema está no sistema político, do qual o PT não foi solução, alternativa,
mas reforço indecoroso do que há de pior.
A
ignorância do mandatário eleito pelo PT fez com que o Brasil retrocedesse na
política industrial, porque como viveu o boom da ditadura, foi buscar
aconselhamento em Delfim Neto, e trouxe para o governo do Estado o vetusto e
aberrante nacional desenvolvimentismo da década de 70, com os mesmos
resultados, a desindustrialização e a história do Brasil celeiro do mundo.
Caíram as commodities, eis a nação miserável novamente.
Não
estamos em situação de golpe, temos uma presidente incapaz, inepta, que governa
sem nenhuma qualidade de liderança política, arrogante, nunca antes submetida
às urnas e incapaz de fazer o jogo político miúdo, imprescindível para a
governação do Estado. Não é possível que o jornalista não seja capaz de avaliar
que a presidente atual é incapaz de articular um discurso político coerente sem
um que lhe tenha sido escrito antes.
Não
estamos numa quartelada, o Supremo Tribunal Federal não só funciona de maneira
livre, como é buscado o tempo todo pela presidente incapaz, legitimando todos
os atos praticados pelo Legislativo que tem sim, a competência política de
afastar um governante inepto, o que é absolutamente o mérito da discussão que
se desenrola.
Não
vejo canhões, quarteladas, não vejo ofensas à ordem jurídica, não vejo ruptura
das instituições, aliás, as vejo fortalecidas, para além da mediocridade
possível dos homens que as ocupam e de suas limitações morais. Apesar de
Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, há uma Câmara dos Deputados e um Senado da
República que funcionam institucionalmente e livremente.
Vamos
ser honestos, Fernando Collor de Mello foi afastado por corrupção pelo
Congresso e inocentado pelo STF mais tarde por falta de provas, por que? Porque
o processo de Impeachment é um processo político, cujas razões jurídicas são
determinantes apenas e tão somente para o questionamento da legitimidade
política da permanência do imperial presidente da República.
Um
presidente que não tem 140 votos a seu favor na Câmara dos Deputados pode
governar? Um presidente incapaz e inapto deve governar porque seu mandato tem
quatro anos? Seria uma crueldade atroz condenar a sociedade brasileira a
conviver com o “poste” instalado no Planalto pelo líder popular do Guarujá.
Lamentei
muito o texto do colunista porque demonstra desprezo e desrespeito pela
sociedade brasileira. Há que ser um país muito democrático para em 28 anos de
sua última carta ter a coragem e a seriedade de submeter dois presidentes a
Impeachment, fortalecendo suas instituições, mostrando ao povo que é possível
eleger, mas também afastar políticos ineptos, incapazes e que têm demonstrado
de maneira irretorquível sua falta de vocação para o exercício da primeira
magistratura do país.
Visão
preconceituosa, repetidora dos mais condenáveis vícios de encarar os milhões de
brasileiros que vão às ruas condenar este governo incapaz de quererem um golpe.
O que eles querem é o fim do estelionato eleitoral, da corrupção
institucionalizada, do aparelhamento do Estado, o que o povo quer é o fim deste
governo. Poderá até, como diz o Discurso da Servidão Voluntária de De La
Boétie, eleger Lula novamente e assim conquistar sua servidão, mas isso é da
democracia.
Os
54 milhões de votos de Dilma Vana Roussef não representam nem 33% do total de
eleitores do país, representa a maior minoria, e assim, sua legitimidade é
precária, na medida em que tem como necessário corolário não mentir, não
prometer, não promover falsas esperanças e ainda, de ter capacidade de bem
gerir o Estado. Ela não tem, e assim, a carta política, democraticamente,
permite o seu afastamento para o bem da sociedade que o exige.
Não
senhor Jânio de Freitas, o Brasil não está passando por um golpe, está sim
dando o exemplo de maturidade democrática, de que mais uma vez, levadas ao
limite, as instituições, mesmo com suas limitações, mesmo com os seus líderes,
conseguem dar solução política ao impasse em que o PT agora nos colocou.
Não,
não posso concordar com a visão estereotipada do Brasil por você exposta, porque
o que está acontecendo o nega peremptoriamente. Porque somos hoje um país mais
democrático, mais responsável e caminhando para sua maturidade política.
A
presidente sairá da história pela porta dos fundos com sua arrogância e
empáfia, pela porta da frente está entrando o protagonismo do povo, está
entrando para a história a certeza de que nossas instituições funcionam, para
lá dos desavisados que se pegam em questiúnculas jurídicas para fazer o papel
de defensores do indefensável.
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