Na coluna do dia de hoje, 21 de abril na Folha de São Paulo, intitulada “A Vergonha e o Terror”,
gostaria de fazer algumas considerações que julgo pertinentes sobre o texto do colunista Contardo Caligaris.
Como
somos contemporâneos, também posso afirmar que suspendi o consultório e me
instalei em frente ao aparelho de televisão para ver a votação do impeachment
de Fernando Collor de Mello, a fraude política que havia ocupado o Planalto
após a primeira eleição direta (1989) depois do Regime Civil-Militar de
1964-1985.
O
espírito não era de liberdade conquistada, pois esta, o foi com o fim dos
generais presidentes, o fim do AI-5 em dezembro de 1978 e o advento da
Constituição “Cidadã” de 1988.
A
sensação era de alívio, de força das instituições e de restabelecimento da
verdade política. Livres já éramos, e só essa liberdade nos permitiu afastar o
indesejável e incapaz presidente.
Obviamente
que o procedimento de autorização da Câmara para a abertura do Processo de
Impeachment junto ao Senado da República, necessita de uma provocação jurídica,
como exige a Constituição. Mas, a partir daí o processo é político.
Daí
exigir que nos 10 segundos de superexposição midiática do voto, possa se exigir
do Deputado Federal que se atenha a dizer SIM ou NÃO me parece profundo
desconhecimento da psique humana.
Todos
estávamos eletrizados para ver se a vontade de milhões de brasileiros que
desejam o afastamento de uma presidente incapaz, arrogante, inepta e sem
capacidade de governar se daria ou não na câmara de representantes.
A
legitimidade caolha de 54 milhões de votos, algo como 33% do eleitorado, que se
fez com mentiras, mistificações, engodos contábeis, não pode afastar a intensa
deslegitimação que ocorreu por se ver envolvida num mar de corrupção,
desmandos, prepotência, falta de humildade e incapacidade de articulação
política.
Não
me perguntei num só momento se aqueles são nossos representantes. Não o fiz,
porque de fato são. São a cópia, melhorada ou piorada da sociedade brasileira,
porque eleitos por ela.
Tendo
um sistema político blindado, são eleitos o que o sistema quer e não o que o
povo poderia supor que elegeria em um sistema mais arejado e livre. No entanto,
o PT governa a quase 14 anos e não só se mostrou incapaz de reformar o sistema
político, como o mimetizou e o reproduziu de forma ainda mais desonesta, mais
servil e de forma abjeta o utilizou para aparelhar o Estado e perpetuar-se no
poder.
Não
sejamos ingênuos. O processo é político e não importa muito quantos dos 367
votos sim falaram das pedaladas fiscais ou dos decretos sem autorização do
Legislativo. Por que teriam de falar assim?
Purismo
elitista. Os 10 segundos de superexposição midiática exige criatividade e força
de vontade de passar por ridículo para ganhar votos, afinal de contas é do jogo
democrático ficar, se fazer, conhecido.
Também
nos 142 votos contrários não tivemos qualquer manifestação de uma inteligência
mais consistente, ou de uma compreensão mais jurídica do procedimento. O que se
viu foi uma reiterada ofensa ao decoro parlamentar dos deputados e deputadas
governistas. Fosse um país sério, estariam todos sendo processados por falta de
decoro.
Concordo
que Jair Bolsonaro barbarizou ao fazer homenagem a Carlos Alberto Brilhante
Ustra que, diga-se de passagem, não estava no DOI-CODI quando a presidente lá
foi presa e torturada.
Lembremos
também que Dilma Vana Roussef nunca foi guerrilheira para instaurar uma
democracia no Brasil, mas buscava, pela revolução, instalar uma ditadura do
proletariado, segundo a visão marxista-leninista e a práxis stalinista que
amparava seu agir.
Dilma
não resistiu à ditadura, queria apenas substituir uma fascista por uma
comunista, praticando crimes comuns contra a sociedade brasileira, já que sem
respaldo no povo que dizia estar salvando.
Obviamente
a homenagem de Jair Bolsonaro também deveria ser levada ao Conselho de Ética
por falta de decoro e ao Supremo como apologia da tortura. Mas, o que vale para
um lado, vale para o outro, o que torna inescapável a punição da esquerda
também. Bolsonaro é, dadas as devidas proporções, um Trump piorado à
brasileira.
A
alternativa que se põe é a que venceu nas urnas, Temer foi escolhido pelo PT e
sufragado pelo povo. Se há alguém sem legitimidade para arengar contra o
vice-presidente é o PT e Lula da Silva.
Bolsonaro
é fascista? Provavelmente o pior que o fascismo pode produzir, mas para
resistir-lhe basta que o sistema político continue a dar provas de
responsabilidade política e de fortalecimento das instituições. Resistir é
acreditar que incapazes, corruptos, ineptos e extremistas de direita e de
esquerda podem ser afastados da política pelo voto ou pelo respeito ao
ordenamento jurídico.
A
sessão do impeachment na Câmara tem a cara do Brasil, não reconhecer que aquele
circo montado na representação nacional tinha muito de nosso jeito Tiririca de
ser é desconhecer a alma do brasileiro, que galhofa, que samba, que ri de si
mesmo, mas é capaz de em 24 anos afastar dois presidentes sem a ruptura da ordem
democrática, numa lição de cidadania.
Assim,
dia 17 de abril foi uma escola de como se afasta alguém rancoroso, falto de
humildade e desprendimento, invocando a “dona Cotinha” que talvez, ao contrário
da velhinha de Taubaté, não acredite em tudo que os poderosos dizem para
escapar do julgamento das ruas.
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