terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Dar o nome certo: Tirania!

 




Quando visitamos a obra de Sófocles, o Édipo, um dos aspectos fundamentais é a manifestação do coro que exige a proteção das leis. Ora, isso porque são as leis a primeira coisa que se pisoteia quando se quer destruir a democracia, quando se quer violar o Estado de Direito.

Quando somos lenientes com a intemperança, com a insensatez, essas engendram o despotismo, que tem sempre manifestas, intensas e dolorosas consequências para todo o povo.

Como diz Marcos Aguinis, autor de Pobre Patria Mia!, vivemos um momento em que é necessário invocar a memória de “Gaetano Filangieri (1752-1788), filósofo que demonstrou há três séculos que para fundar uma democracia não bastam apenas leis:” é necessário que as regras do jogo sejam incorporadas ao espirito do povo, convertendo-se numa amplamente difundida e sólida religião cívica. No Brasil falta esta incorporação, esta compreensão de que a democracia liberal representativa pode ser um sistema ruim, mas como diz Churchill, não se conhece nenhuma melhor do que ela.

O Estado tem o dever de educar sua população para que se saiba defender os direitos fundamentais de todos. A ditadura militar de 1964 a 1985 foi um desastre quanto à educação e à formação de um civismo básico que desse consistência à defesa da Democracia. Nosso povo não aprendeu a valorizar as instituições e o sistema democrático. Não fomos ensinados a sair e resistir à condição de servos.

Estamos vivendo um período muito triste de retrocesso político e de esgarçamento das instituições. Desde 2015 as forças políticas despidas de seu compromisso com a democracia têm feito um balé de perigosos conciliábulos e manobras que levam ao descrédito a arquitetura construída em 1988. A eleição de 2018 foi realizada sob o signo de uma campanha de desmoralização do sistema político, movida por uma força tarefa do Ministério Público e de um juiz que apenas tinham por norte sua autopromoção e a destruição do sistema vigente. Não vislumbravam sua reforma, nem sua emenda, mas sua destruição, com a mesquinha intenção de representarem o papel de salvadores da pátria.

Assim, a divisão política patrocinada pelo PT durante os seus 13 anos de governo, em que a política foi dividida entre nós e eles, em que a política deixou de ser um jogo entre adversários, mas uma guerra entre inimigos, trouxe ao proscênio um sujeito absolutamente desqualificado, cujo discurso virulento é uma violação do Estado Democrático de Direito, apenas por ser proferido.

O capitão reformado é cria de uma situação de coisas criada pelo PT e por sua ganância de poder e aparelhamento do Estado. A insistência de Lula de ser o candidato do partido foi o combustível que permitiu o impensável chegar ao segundo turno do certame eleitoral, para depois, incorporando o ódio e o desalento, eleger-se Presidente da República.

Mas Jair nunca foi um democrata, nunca foi um político que respeitasse as instituições e o jogo democrático. É antes um tirano. Como um tirano adota todo o tempo medidas irritantes, mente de maneira desavergonhada e compulsiva, diz e desdiz sem pejo e ameaça todo o tempo medidas de força, praticando-as de forma surda, escamoteada.

É nos governos dos tiranos que abundam castigos injustos (veja-se o fiscal do Ibama que tentou multar um deputado que desrespeitava a lei), destituições (Mandetta), desqualificações, perseguições, desterros (Jean Wyllys) e homicídios (alguém esqueceu Adriano da Nóbrega e Marielle Franco). O tirano é um sujeito violento, que ignora a piedade e o perdão, que considera sinais de debilidade em seu machismo atávico. Não se põe no lugar do outro, a quem ignora e dirige desprezo quando não lhe serve ao projeto de poder.

O tirano encara que tudo deveria pertencer-lhe e por isso tenta de todas as maneiras apropriar-se dos bens e dos poderes alheios. Mente sem pudor e insiste que governa para todos os cidadãos para encobrir seus desmandos. Falta-lhe a capacidade de perceber a realidade e no interior de seu claustro impermeável considera a realidade diferente do que realmente ela é, como podemos bem perceber com todo o descaso, toda a insensatez com a condução da Pandemia de COVID-19.

Temos de resistir à tirania que se instala no Brasil, compreendendo a natureza do adversário, e para que não percamos o ânimo temos de lembrar com Plutarco, um dos famosos sábios da Grécia chamado Bias de Priene, do século VI a.C., que interrogado sobre os animeis selvagens, respondeu: “Dos animais selvagens, o mais feroz é o tirano. ”

Resistamos!

 

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Deodoro faz escola no Peru





Países nos quais a tradição da ordem democrática e do Estado de Direito não se consolidaram, permanecendo um ranço caudilhesco, sempre há a possibilidade da ruptura constitucional e há um namoro com a ditadura do salvador da pátria. No Peru tal tentação está sempre presente, Alberto Fujimori é exemplo recente.
Quando Montesquieu defendeu a distribuição do poder soberano por três instituições do Estado, visando a defesa da cidadania e a proteção contra o abuso do poder, tinha em mente que cada uma preservaria para si uma porção generosa da soberania e que através de um mecanismo de freios e contrapesos, garantiriam o Estado de Direito.
Não há na teorização da construção do Estado sob este paradigma uma preeminência de um dos poderes, mas o primeiro país que implantou um sistema amparado em suas ideias, manteve na figura do chefe do poder executivo, algumas das prerrogativas dos Reis dinásticos, como a representação externa e o comando da chefia das forças armadas.
Esta pequena concessão criou um desequilíbrio que levou a Benjamin Constant de Rebecque perceber a necessidade de um Poder Moderador que funcionasse como chave interpretativa e funcional dessa tripartição.
A democracia e o Estado de Direito apenas tiveram viço nos países latino americanos após a independência no único país monarquista, o Brasil. E apenas porque foi sábio o suficiente para acolher o pensamento de Benjamin Constant e evitar o caudilhismo, a praga que graça até nossos dias nos países de tradição ibero-espanhola.
No entanto, quando do golpe militar que instaurou a ditadura militar de 1889 a 1891 e a República, Deodoro da Fonseca trouxe para o Brasil essa maldição do poder imperial de presidentes militares ou apoiado por militares, que desrespeitam as instituições em nome dos mais variados motivos, desde clamor popular até visões salvacionistas.
Foi com a postura arrogante de um chefe imperial que Deodoro alegando que não havia condições mínimas para exercer com dignidade o seu posto, decretou a dissolução do Congresso eleito em 1890. Ainda sob a sombra do período Imperial, o Brasil rejeitou a manobra e Deodoro teve de renunciar ao poder e entrega-lo ao “marechal de Ferro” de triste e assassina memória.
Assim, em 2019 se repete no Peru essa triste tradição de um presidente julgar democrática a solução de fechar o Congresso e impor um ruptura com a ordem Constitucional, resultado do enfraquecimento das instituições republicanas, em processo alarmantemente paralelo com o que vem se sucedendo, não na mesma proporção, em nosso país.
Martín Vizcarra se escuda num questionável apoio popular para desmantelar o Estado Democrático de Direito. O caso do Peru é a soma de megaescândalos de corrupção, com um sistema político extremamente fraturado e dividido, a perda da dignidade da classe política e um judiciário incapaz de com responsabilidade defender a Ordem Constitucional.
O problema é que as semelhanças com o nosso país são perturbadoras. O Ministério Público vem se comprometendo com um ativismo político inaceitável e as confissões abobalhadas de Janot só vêm para reafirmar a instrumentalização política de um órgão de Estado que deveria ser o custus legis, ou seja, o defensor da Lei.
O Judiciário interpreta a seu bel prazer a Constituição e utiliza um inquérito para fazer busca e apreensão na casa de Janot, sem que haja crime a ser apurado, na busca de provas de uma propaganda mal intencionada de um livro mal escrito.
O Executivo, bom, este está sem programa, sem direção política e apostando num salvacionismo avant la lettre, tal qual um Sebastião que volta do passado da ditadura militar para salvar o Brasil de sua democracia.

Surrealismo





O surrealismo é um movimento artístico surgido na França nos anos 20 do século passado, como reflexo da tormentosa revolução tecnológica que afligiu a sociedade humana desde a década de 70 do XIX e que culminou com a destruição industrial da cultura e da humanidade, no prelúdio que foi a primeira guerra mundial de 1914.
Como dizia André Breton, um de seus principais teóricos, o movimento objetivava “resolver as condições previamente contraditórias entre sonho e realidade”.
O Brasil desde 1988 vem sonhando com uma democracia estável, com a recuperação e a reconciliação com a memória passada da ditadura militar. Período em que contraditoriamente mostrou ao mundo que poderia crescer a índices vertiginosos, mas que ao mesmo tempo levou à estagnação dos anos 80 e ao processo hiperinflacionário. A variação média dos preços nos anos 80, herança do regime militar foi de absurdos 233,5%.
Assim, em meio a uma memória falsificada e expurgada da realidade, a população lembra do que foi positivo ou transformador durante o período militar, mas esquece, esforça-se por não trazer à memória a violência, a falta de liberdade, a truculência policial, o desastre econômico e o abandono da arte, da memória e da cultura, como elementos constitutivos de uma nacionalidade sadia.
As contradições continuaram a se acentuar com a abertura democrática, fundamentada num processo lento, gradual e seguro, para aqueles que renunciavam ao poder e à violência política, deixando como herança um sistema caótico, multiplicando partidos de aluguel e deformando o sistema político. O projeto era permitir toda mudança possível para que tudo permanecesse o mesmo.
Tais manobras levaram ao Governo FHC, um momento de lucidez que fez o necessário para reformar economicamente o país e livrá-lo do flagelo inflacionário. Houve uma sincera busca pela consolidação do regime. No entanto, fruto dos conflitos internos e inerentes ao sistema, a cultura política se fragmentou em dezenas de partidos inexpressivos, abúlicos e de aluguel.
O único movimento que subsiste envergonhado é a geleia amorfa chamada Centrão. Fisiológico e adesista, vai dando alguma previsibilidade ao funcionamento do Legislativo. No entanto as contradições se agravaram e a tentativa do PT de se apropriar dos sistemas de aparelhamento do Estado, antes nas mãos do MDB, determinaram o surgimento de um embate final, tendo como resultado o Mensalão e a Lava Jato.
Dos escombros do conflito político-partidário pelo espólio do Estado e de sua reorganização em benefício de um dos grupos em luta, surge um movimento surrealista na política brasileira. Um deputado do baixo clero, 28 anos sem absolutamente nenhum brilho, que é reacionário, saudosista do regime militar e adorador de torturadores, além de ter passado por cinco partidos inexpressivos durante sua carreira política, chega ao poder e no poder estremece as instituições e cria incêndios diários, para depois atear sobre ele gasolina, para ver se incinera o Estado e a sociedade brasileira.
É surrealista ver um presidente da República se envolvendo em mesquinharias políticas, disputando o comando de uma legenda inexpressiva, usando a Polícia Federal para investigar o presidente da legenda que o elegeu. A deslealdade e o banditismo se instalam desde o centro mais elevado de poder da República.
O colapso do sistema político interessa àqueles que querem destruir as instituições, e a não ser pela Câmara dos Deputados, com o conluio do STF, caminhamos para o abismo do Estado de Exceção.

Topa tudo por dinheiro





Não é à toa que o Presidente Bolsonaro e sua tropa de metralhas, 01, 02 e 03 são assíduos frequentadores dos programas e dos repórteres do SBT. Na realidade essa frequência nada mais é que a corroboração do show “Topa tudo por dinheiro” criado por aquele canal de televisão.
O que temos visto de disputas entre o Presidente da República e o Presidente do seu partido, o PSL, nada mais é que a disputa por R$ 110 milhões do fundo partidário. Dinheiro público que é distribuído às agremiações políticas como consolação para o fim do financiamento de campanhas pelas pessoas jurídicas.
É apenas um vale tudo por dinheiro. É um constrangimento público, uma rinha de galos por espaço num partido nanico que emprestou sua estrutura para a vitória de um candidato inexpressivo do baixo clero da Câmara.
Como a história nos ensina, há que entender que existem certas condições estruturais que tornam possível o aparecimento de demagogos. O Brasil mimetiza neste alvorecer do século XXI, os anos 1920-1930 da Europa.
Tanto naquele tempo como agora, os demagogos surgem das mais variadas formas. Vão desde populistas sem crenças fundamentais genuínas a ideólogos de diversas convicções políticas. No caso do Brasil, temos um demagogo sem crenças fundamentais, manipulador de uma rede de “fake News” só agora denunciada pela sua ex-líder no Congresso. Enquanto estava no comando da liderança calou-se, agora confirma o que todos já sabiam. Os filhos do presidente são os milicianos da Internet que espalham falsas notícias e ataques no mundo virtual.
Sabemos também que muitos destes atores políticos são racionais, outros irracionais. O nosso presidente é irracional, busca de forma intuitiva o conflito para chegar ao objetivo de desmantelar e dominar as instituições em proveito exclusivo de seus filhos.
Com sua irracionalidade, seu agir se caracteriza por uma personalidade que sempre busca e leva a soluções crescentemente mais extremas e conflituosas, que não sabem onde parar, plantando assim a semente da autodestruição, carregando consigo as instituições do Estado e a harmonia da sociedade.
Muitos destes demagogos estão entre aqueles que acreditam que qualquer acordo que não seja tático é nocivo. É o caso do nosso presidente. Para derrubar o Delegado Waldir e passar para seu filho a liderança do PSL, num golpe de mão bastante imoral, colocou seu Ministro-Chefe de Governo para tecer um acordo com o presidente do partido, com a renúncia do líder e a escolha de um terceiro nome, e quando esta se operou, mais que depressa traiu os acordos para conseguir emplacar o filho na liderança e tentar assim, tomar as rédeas do partido.
A linguagem comum dos demagogos populistas, seu estilo e sua alegação ordinária de que são outsiders que representam os interesses reais do povo ocultam sempre o tipo de demagogo que provavelmente se tornarão. Importante entender que alguém que ficou 28 anos no Congresso, que fez dos filhos políticos da velha estirpe, e que bradou para quem quisesse ouvir que se não ganhasse as eleições era pela existência de fraude, não é diferente, nem está fora do sistema político. Antes disso é expressão necessária do sistema em que foi eleito.
Por essas e por outras razões é que vivemos um “Vale tudo por dinheiro” protagonizado pelo primeiro mandatário da nação e sua família. O problema é que não sabemos em quem ele se transformará: num Hitler, num Franco, num Lenin ou num Salazar,
É por isso que devemos nos manter vigilantes, alertas e recusando dar ibope a este medonho show de horrores. Resistir!

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

República? Que República?





O Brasil deixou de ser Império em 1889. Desde então, dizem os crédulos, as escolhas para ocupar cargos e representações do Estado estão sob os auspícios da Lei e do mérito. Que ser fidalgo, literalmente, filho de algo, não é credencial para qualquer função pública. Será?
O Decreto-Lei n. 9.202 de 26 de abril de 1946, assinado por Gaspar Dutra, estabelece em seu artigo 5º:

“Art. 5º Os Embaixadores serão nomeados em comissão e escolhidos dentre os funcionários da classe N da carreira de “Diplomata.
§ 1º Excepcionalmente, a nomeação poderá recair em pessoa estranha à carreira de "Diplomata" brasileiro nato, maior de 35 anos, de reconhecido mérito e com relevantes serviços prestados ao Brasil.
§ 2º A comissão de Embaixador cessará automaticamente com o têrmo do mandato do Presidente da República que houver feito a nomeação.”

Está escrito que diplomatas serão escolhidos exclusivamente na carreira e na classe N. O § 1º faz uma excepcionalidade para brasileiros natos com mais de 35 anos, reconhecido mérito, entenda-se, diplomático, e com relevantes serviços prestados ao Brasil.
Eduardo, o 02, preenche apenas duas dessas exigências. É brasileiro nato e tem, por graça e obra de Deus, mais de 35 anos. No entanto, a não ser na condição de fidalgo, não reúne qualquer mérito conhecido em relações diplomáticas. E obviamente, que se tenha conhecimento, nunca prestou qualquer serviço relevante ao Brasil.
70% dos brasileiros têm opinião contrária a esta sinecura injustificável. Mas o autocrata instalado no Planalto, acredita que deve servir filés mignon ao filho fritador de hambúrgueres às custas da imagem, da seriedade e dos cofres públicos do Brasil.
Cabe ao Senado Federal, instituição da república, aprovar ou não tamanha desfaçatez. Devemos, no entanto, lembrar o que dizia Bernardo Cabral, em 2001:

“O Senado tem de deixar de ser catedral na frente e bordel nos fundos!”

Lapidar a frase do ex-relator da Constituinte de 1988. Mas para percebermos como muitas vezes o bordel é o que prevalece na condução dos deveres impostos ao Senado, temos de lembrar também do que diz a Constituição para a indicação dos Ministros do STF:

“Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada.
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.”

Dias Toffoli que hoje preside a mais alta Corte brasileira, também preenchia apenas os dois primeiros requisitos, ser cidadão e ter entre 35 e 65 anos. Não contava com notável saber jurídico e a reputação ilibada tem que ser sustentada pela Dra Christiane Araújo de Oliveira.
No entanto Lula da Silva propôs seu advogado ao Senado e este servilmente o aprovou.
Na semana em que Bolsonaro esclareceu que colocou um “chucro” na Economia, um “ingênuo” no Ministério da Justiça e um inútil entusiasta no Ministério das Relações Exteriores, temos que a última barreira para que nossa República não seja definitivamente alcunhada de “das Bananas”, será a resistência do Senado a mais este desestímulo à cidadania republicana e ao mérito.
Talvez seja a resistência de parcela significativa da população e um certo brio no Senado que fizeram o autocrata boquirroto anunciar: “Se eu levantar a borduna, todo mundo vai atrás de mim e eu não fiz isso ainda”!
Como ainda, cara pálida?

Texto originalmente publicado no jornal Diário dos Campos.

domingo, 21 de julho de 2019

Senado para quê?





O Senado da República foi instituído como órgão representativo da federação e como instância revisora das paixões políticas que pudessem encontrar expressão na Câmara dos Deputados e desestabilizar as instituições.
Deveria constituir-se na câmara revisora que trouxesse equilíbrio, sobriedade e seriedade ao sistema político. Ocorre que, ao contrário dos Estados Unidos onde apenas 2 senadores são eleitos para cada um dos 50 estados, com mandatos alternados, o Brasil acabou tendo 3 senadores para cada unidade, com mandatos extremamente longos, determinando a constituição de uma casta de políticos coronelistas, oligarcas e patrimonialistas.
Outra importante deformação do sistema bicameral no país é que o Nordeste com 9 Estados membros e o Norte com 7, totalizando 16, têm 48 representantes em 81 possíveis. Ou seja, sem a anuência das duas regiões mais pobres e dependentes do governo central nada se aprova ou pode ser votado no país.
Tanto é assim, que desde a Constituição de 1988, apenas 1 presidente do Senado foi de região distinta de Nordeste/Norte. Foi o Senador Ramez Tebet do Mato Grosso do Sul entre 2001-2003.
Durante o período Lulo-petista o Senado foi um feudo de Sarney e de Renan Calheiros que se revezaram na presidência do Poder. Mas, para além de suas deformações do sistema político, o Senado não vem cumprindo com suas funções, tornando-se apenas e tão somente um balcão de negociatas das oligarquias nordestinas e nortistas, sem nenhum serviço relevante prestado para a proteção das instituições e para o engrandecimento e o enraizamento da democracia no país.
Exemplos de quanto o Senado não cumpre com o seu papel são muitos, mas dois recentes são particularmente eloquentes para demonstrar a total ineficiência e necessidade de extinção do órgão, na medida em que, descumpre suas relevantes funções.
O primeiro fato relevante é a nomeação de Dias Toffoli para o STF. Em 2009 Lula da Silva indicou para ministro o Advogado Geral da União que tinha sido advogado do PT, das campanhas do presidente e que não reunia, sabidamente, os requisitos exigidos pela Constituição para ocupar uma vaga de ministro na Suprema Corte.
É tão vergonhosa a indicação, que Dias Toffoli nunca se absteve de participar dos julgamentos em que seu ex-representado ou seu chefe na Casa Civil eram réus, numa flagrante violação do Código de Processo Penal. A atuação de Dias Toffoli durante todo o período é de fragilização da Lava Jato e da capacidade investigativa do Ministério Público, culminando ontem (16/7) com liminar para suspender, em âmbito nacional, os processos de lavagem de dinheiro o que é do interesse de gregos e troianos.
O segundo fato relevante é quando o ex-ministro da Integração Regional (2011-2013), Fernando Bezerra Coelho, líder do governo Bolsonaro no Senado, garante que há maioria parlamentar para a aprovação do deputado que sabe falar inglês (porque fez intercâmbio de 6 meses), espanhol e sabe fritar hamburguer, para ser embaixador em Washington.
É vergonhosa a subserviência e a rendição do Senado ao poder imperial dos presidentes da república, e se não são capazes de resistir às sandices, se não são capazes de fazer valer a respeitabilidade das instituições republicanas e dos deveres de que são investidos, não há porque despender tamanho esforço para manter um órgão meramente homologatório da vontade estapafúrdia do presidente de plantão.
Se o Senado Federal aprovar a designação do deputado do hambúrguer para a embaixada, então, vamos fazer uma campanha honesta pelo seu fechamento. Para que Senado?

Texto originalmente publicado no jornal Diário dos Campos.