quinta-feira, 11 de julho de 2019

Um Brasil cada vez mais dividido




A sociedade brasileira vem sofrendo processo de clivagem que se acentua com o advento do governo do PT. A Constituição de 1988 ao fundar um Estado Social de Direito propugnava a solidariedade e o resgate das camadas populares, mas o que produziu foram fraturas que tem se acentuado.
A primeira constatação que precisamos fazer é que, segundo o DataFolha, a aprovação do presidente fica em torno de 33%, sua reprovação em 32% e temos uma geleia que não aprova nem desaprova, mas migra para um polo ou outro dependendo das condições da economia.
Ilustrativo das divisões existentes no país é que nos que aprovam o governo de Bolsonaro, vemos os mais ricos, os mais velhos, nos Estados do Sul e do Sudeste. Lugares onde a renda é maior e onde a proporção de idosos e aposentados é também maior.
A constatação óbvia é que por ser uma população mais idosa, tem um saudosismo canhoto dos militares. O golpe promovido em 1964 pretendia resgatar a economia brasileira que patinava, evitar o fantasma do comunismo e acabar com a inflação. 
A ditadura pouco fez de relevante nestes termos e utilizando-se da fartura de petrodólares no final da década de 60 e início do 70, fez empréstimos a custo baixo e promoveu um crescimento chinês que se espatifou na primeira crise do petróleo em 1973. A partir de então o nacional-desenvolvimentismo dos militares levaram o país a crescentes déficits e a crescimentos dignos do Haiti.
O saudosismo esquece que, apesar de 5 anos de crescimento vertiginoso, os militares deixaram ao país um legado de mais de 20 anos de hiperinflação e estagnação econômica, com o empobrecimento intenso das camadas populares, regados à ironia do “deixar crescer o bolo para só então distribuí-lo”!
As camadas que apoiam o capitão reformado, viúvas da ditadura, são aqueles que tem o saudosismo reverencial de uma política econômica que trouxe estagnação, hiperinflação e empobrecimento do país até o advento do Plano Real em 1994. Sem o governo de FHC, sem a Democracia-social, o Brasil jamais teria alcançado os bons resultados dos anos 2000.
A segunda constatação é que a aprovação da reforma da previdência é mais popular exatamente nas camadas populares mais abastadas e mais idosas, ou seja, aquelas que não são atingidas pelas mágicas de empobrecimento oferecidas à população em troca de uma suposta restauração da saúde financeira do Estado.
É fácil para os agora aposentados dizerem que o brasileiro se aposenta cedo, que as aposentadorias têm de ser reduzidas, que há que comprimir os gastos com a previdência, na medida em que os seus direitos já estão assegurados e que militares e aqueles encastelados no poder encontram fórmulas de se protegerem dos sacrifícios impostos a toda a sociedade.
É bizarro encontrar pessoas defendendo o discurso de que crianças podem trabalhar e que tal não fere a dignidade e os direitos fundamentais dos menos favorecidas. Os mais velhos que hoje apoiam estas sandices, têm individualmente memórias edulcoradas e românticas sobre o que é o trabalho infantil e sobre os seus esforços para ganhar a vida e chegar, por mérito, à situação em que se acham. Esquecem a vastidão do país, a miserabilidade de imensos territórios e da indignidade com que muitos dos filhos do Brasil são tratados, explorados até à miséria e à morte.
Talvez a divisão que verificamos na população brasileira destes tempos tão deprimentes, exponham os aspectos mais apavorantes da face de um país que não é cordial, que não é brejeiro, que não é solidário e talvez por isso, a igreja que mais lutou contra o arbítrio e a ditadura esteja em declínio. Será que queremos um ministro terrivelmente evangélico no STF, ou queremos democracia e liberdade?

Laércio Lopes de Araujo


Texto originalmente publicado no jornal Diário dos Campos!

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