quinta-feira, 21 de abril de 2016

Não Outra Vez






Fiquei surpreso e entristecido com o texto de Jânio de Freitas que li em 17 de abril próximo passado na Folha de São Paulo. Não porque constate que chegamos a uma encruzilhada, mas pelo fato de que irrefletidamente repete uma avaliação pejorativa do povo e da sociedade brasileira como inapta para a vivência da democracia.
Não acredito que continuamos a repetir arengas da década de 70 e 80 de que somos historicamente inaptos para o regime democrático, quando os fatos de 1992 e 2016 o provam de forma peremptória o contrário.
Estou de acordo que a democracia exige refinamento, que sua construção é difícil, mas quando vejo as instituições da república funcionando, acredito que estamos muito próximos da maturidade política e democrática. O que nos falta é uma reforma política para retirar a blindagem do sistema político e permitir maior transparência e maior engajamento das forças vivas da sociedade.
A forma preconceituosa de se referir ao desenvolvimento mental da minoritária camada da sociedade que detém os instrumentos de direção política é muito dolorosa e desrespeitosa com nossa sociedade. Falta de conhecimento do que nos esperava, e que já estava delineado por cientistas políticos sérios desde meados de final da primeira década deste século, como a constatação de que o que vivemos é fruto da liderança carismática, exercida nos moldes weberianos por Lula, e que José de Souza Martins (A Política no Brasil: lúmpen e místico) já denunciava como aquele que se utilizou de instrumentos de clientelismo eleitoral, institucionalizando o conformismo político, incorporando ao mesmo tempo massas desvalidas e tuteladas pelo Estado megalômano ao plano clientelista neopopulista de esquerda.
Se podemos reprovar alguma falta de qualidade moral, só podemos reputá-la neste momento ao mal que Luiz Inácio Lula da Silva fez para o desenvolvimento de uma sadia sociedade política plural e mais democrática. O preço do aparelhamento do Estado e do plano de neopopulismo de esquerda clientelista, tornou-se alto demais, falindo o próprio Estado e chegando ao impasse político que vivemos.
O discurso de ver o Brasil como um país atrasado de industrialização tardia denota um conhecimento raso de história geopolítica, na medida em que o nosso país foi concebido e construído por uma nação de heróis, onde viviam pouco mais de 1 milhão de almas no século XVI. Mesmo assim, somos uma das maiores nações do planeta. Mesmo estando à margem dos fluxos de comércio e dos capitais desde a origem do mercantilismo.
Lamentável os estereótipos lançados sem pejo pelo colunista. Se a classe dominante, “as elite (sic)”, preferem amontoar patrimônio com pouca avidez pelo investimento em produção e crescimento, isto se dá porque o golpe republicano trouxe para o Estado o domínio de oligarquias regionais que se encastelaram no poder e se repetem em desfavor da sociedade, mas, e é importante salientar, não são alteradas, mesmo pelo líder popular, que se alia a elas, já que Lula é um político sem ideologia que precisa para se eleger de um partido sem votos. O problema está no sistema político, do qual o PT não foi solução, alternativa, mas reforço indecoroso do que há de pior.
A ignorância do mandatário eleito pelo PT fez com que o Brasil retrocedesse na política industrial, porque como viveu o boom da ditadura, foi buscar aconselhamento em Delfim Neto, e trouxe para o governo do Estado o vetusto e aberrante nacional desenvolvimentismo da década de 70, com os mesmos resultados, a desindustrialização e a história do Brasil celeiro do mundo. Caíram as commodities, eis a nação miserável novamente.
Não estamos em situação de golpe, temos uma presidente incapaz, inepta, que governa sem nenhuma qualidade de liderança política, arrogante, nunca antes submetida às urnas e incapaz de fazer o jogo político miúdo, imprescindível para a governação do Estado. Não é possível que o jornalista não seja capaz de avaliar que a presidente atual é incapaz de articular um discurso político coerente sem um que lhe tenha sido escrito antes.
Não estamos numa quartelada, o Supremo Tribunal Federal não só funciona de maneira livre, como é buscado o tempo todo pela presidente incapaz, legitimando todos os atos praticados pelo Legislativo que tem sim, a competência política de afastar um governante inepto, o que é absolutamente o mérito da discussão que se desenrola.
Não vejo canhões, quarteladas, não vejo ofensas à ordem jurídica, não vejo ruptura das instituições, aliás, as vejo fortalecidas, para além da mediocridade possível dos homens que as ocupam e de suas limitações morais. Apesar de Eduardo Cunha e de Renan Calheiros, há uma Câmara dos Deputados e um Senado da República que funcionam institucionalmente e livremente.
Vamos ser honestos, Fernando Collor de Mello foi afastado por corrupção pelo Congresso e inocentado pelo STF mais tarde por falta de provas, por que? Porque o processo de Impeachment é um processo político, cujas razões jurídicas são determinantes apenas e tão somente para o questionamento da legitimidade política da permanência do imperial presidente da República.
Um presidente que não tem 140 votos a seu favor na Câmara dos Deputados pode governar? Um presidente incapaz e inapto deve governar porque seu mandato tem quatro anos? Seria uma crueldade atroz condenar a sociedade brasileira a conviver com o “poste” instalado no Planalto pelo líder popular do Guarujá.
Lamentei muito o texto do colunista porque demonstra desprezo e desrespeito pela sociedade brasileira. Há que ser um país muito democrático para em 28 anos de sua última carta ter a coragem e a seriedade de submeter dois presidentes a Impeachment, fortalecendo suas instituições, mostrando ao povo que é possível eleger, mas também afastar políticos ineptos, incapazes e que têm demonstrado de maneira irretorquível sua falta de vocação para o exercício da primeira magistratura do país.
Visão preconceituosa, repetidora dos mais condenáveis vícios de encarar os milhões de brasileiros que vão às ruas condenar este governo incapaz de quererem um golpe. O que eles querem é o fim do estelionato eleitoral, da corrupção institucionalizada, do aparelhamento do Estado, o que o povo quer é o fim deste governo. Poderá até, como diz o Discurso da Servidão Voluntária de De La Boétie, eleger Lula novamente e assim conquistar sua servidão, mas isso é da democracia.
Os 54 milhões de votos de Dilma Vana Roussef não representam nem 33% do total de eleitores do país, representa a maior minoria, e assim, sua legitimidade é precária, na medida em que tem como necessário corolário não mentir, não prometer, não promover falsas esperanças e ainda, de ter capacidade de bem gerir o Estado. Ela não tem, e assim, a carta política, democraticamente, permite o seu afastamento para o bem da sociedade que o exige.
Não senhor Jânio de Freitas, o Brasil não está passando por um golpe, está sim dando o exemplo de maturidade democrática, de que mais uma vez, levadas ao limite, as instituições, mesmo com suas limitações, mesmo com os seus líderes, conseguem dar solução política ao impasse em que o PT agora nos colocou.
Não, não posso concordar com a visão estereotipada do Brasil por você exposta, porque o que está acontecendo o nega peremptoriamente. Porque somos hoje um país mais democrático, mais responsável e caminhando para sua maturidade política.
A presidente sairá da história pela porta dos fundos com sua arrogância e empáfia, pela porta da frente está entrando o protagonismo do povo, está entrando para a história a certeza de que nossas instituições funcionam, para lá dos desavisados que se pegam em questiúnculas jurídicas para fazer o papel de defensores do indefensável.

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